Deparo-me com uma pedra gigante
moldada a orangotango, uma enorme boca e uma sonante voz que me apela ao jogo.
Alinho na brincadeira e jogo. É a janela do tempo! No prazo do cair de uma
moeda, sai um pequeno papel manuscrito comunicando que era de novo uma criança.
Aproveita…a contagem decrescente começa AGORA!
Já ouço o tiquetaque dos ponteiros do
relógio castrador…
O coração bate mais rápido e os olhos
correm descontrolados pelas imagens de fantasia em meu redor. Como qualquer
criança, não planeio o trajecto e deixo-me ir… entrando neste e noutro filme da
minha imaginação! De um enorme disco voador nasce uma fila de espera de demasiados
humanos para nele entrar. Vou neste! – decido, sem hesitar. Para
onde? Para onde me levar!
Chama-se Space Mountain! A adrenalina acerca o meu cérebro sem avisar. As endorfinas
extasiam as sensações e o coração decide pregar-me um susto de morte. A cervical
petrifica. A tensão domina os movimentos e a respiração torna-se lenta,
tentando dominar os restantes sentimentos sem regra, que comparecem sem ser convidados,
em turbilhão e êxtase, qual ciclone endiabrado. As mãos suam agarrando com
força a geringonça protectora. Sinto tudo menos protecção! Entre alucinantes berros
de felicidade, ouvem-se gritos de aflição e pavor. A velocidade diminui e vê-se,
por fim, a luz do dia…A viagem termina. Gostaste? – perguntam-me. Sim – contesto,
saindo da nave em movimentos lentos, ainda atordoada. Sentiste os loopings, viste as estrelas e os
cometas? Não. Ver, não vi nada. Mas senti, sem dúvida alguma que senti. O quê,
também não sei. Mas sentir, senti!
Fui inconsequente. Ingénua. Desconhecia
o mundo para além do meu. Tal como uma criança irreflectida. Mas, tal como essa
mesma criança, não me arrependi.
Se a primeira experiência foi imponderada,
da segunda não posso afirmar o mesmo. Mais uma montanha russa. Mais um ratinho
que rói cá dentro. Mais velocidade na corrente sanguínea, bombeada pelo bater
cada vez mais forte do meu coração. Carruagem número 3, por favor!
(soa a uma ordem). Descem
os apetrechos de segurança e lá vamos nós. Sou louca! – penso. Porque faremos
estas coisas a nós mesmos? (pergunta retórica). Porque as emoções fazem-nos sentir
vivos, talvez. Num mundo onde as pessoas não sorriem umas para as outras; não
desejam um bom dia quando se cruzam; onde evitam até um cruzar de olhares que
as exponha. Aqui a história é outra: qualquer um grita, sem vergonha; chora,
sem dor; crava as unhas na perna de um perfeito desconhecido que se sentou a
seu lado. Pela frente, o céu. E mais uma descida arrepiante em queda livre sem
inspirar, nem expirar. Mais uma curva que tememos não fazer. A cada segundo, o
medo. A cada curva, a dúvida. A cada solavanco, o coração sobe à boca. A cada looping, volta a ser engolido. A cada 8
traçado, a cólica intestinal. A cada frear de velocidade, a gargalhada de doce
alívio.
Esta viagem continua. Corro para os
cachorros, mais tarde para as pipocas. Hesito. Desisto das pipocas do comum
cinema a dois, elegendo os melosos farrapos de algodão doce. Escolhas difíceis…
Porque anseio devorar cada momento! Cada instante é vivido como se fosse o
último. Como
é bom voltar a ser pirralha!
Entre a emoção destas corridas loucas
e a magia do apertar de mão do Mickey ou o acenar do Pateta são uns instantes.
A felicidade difunde-se por toda a parte, qual doença de fácil contágio. Os
sorrisos esboçam-se sem ser para a foto. Os pulos acontecem até para o velhote
com bengala. Do frenético chinês ao frio alemão e quente ibérico, todos se
rendem ao encantamento do Palácio das Princesas, seguem o percurso do Robin dos Bosques e
deixam-se assustar pela inocente Casa Assombrada. Consentem perder-se no
labirinto da Alice pois sentem-se certamente no País das Maravilhas!
A noite vai caindo e a beleza cresce.
As luzes conseguem abrilhantar o cenário mais belo. O frio consegue aquecer o
coração feliz. A multidão conforta a solidão da vida. Este lugar envolve-me. A
lágrima que corre é quente. A neve que cai refresca a face cálida. A música que
se ouve inspira os pensamentos. E os sentimentos.
Como não há duas sem três, mais uma
aventura. É noite. Deixo-me levar pela carruagem que range assustadoramente
correndo nos carris, e abraçando o pico de uma montanha. Os assumidos loucos
gritam, acenando com seus braços, em delírio. Os mais discretos engolem o medo a muito
custo, com a boca seca e as escorregadias mãos húmidas.
Lá longe, o barco repleto viaja sem
destino, reflectido nas paradas águas do lago. As luzes compõem o cenário
perfeito para o disparar do flash. As espingardas arremessam aos alvos, qual
western de Hollywood. Visto do céu, as formigas encarreiram para a praça
central. Os bebés dormem nos carrinhos, com os melhores sonhos. A contagem
decrescente inicia: 10…9…8…7…6…5….4…3…2…1…Faz-se luz na cidade das luzes! O
estrondo sonante combina com as cores que rebentam nos céus, com o palácio de
fantasia como cenário de fundo. As taças de champanhe tocam-se. As bocas
aproximam-se. Os abraços apertam. BOM ANO! Ou Bon année ...que seja!
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